sexta-feira, 12 de agosto de 2016

Ser menina


de vestido.
Qual o juízo de valor da frase “Nossa, você joga que nem um homem.”?

Desde pequena, inconscientemente, eu tento me equiparar aos homens, porque, vamos lá, ser homem é muito mais legal. Quando eu era criança eu tentava copiar meu pai em quase tudo.O jeito que ele sentava, me interessava pelos filmes que ele gostava, tentava comer de todas as variedades de comida que ele comia e queria tirar a camisa quando fazia calor. Sim, eu via meu pai ficar sem camisa, meu avô, meu irmão, porque não eu? Depois que tentei fazer isso só faltaram me bater, “Não filha, menina não pode ficar sem camisa.”. Na minha cabeça eu só pensava, “mas eu sou igual a um menino.” Sempre que eu ia na casa do meu priminho eu me jogava nos brinquedos dele que tinham atitude, pois era muito mais aceitável um menino, durante a sua infância, ter bicicleta, carrinho de rolimã, skate, escorregador e balanço do que uma menina. Menina tem cozinha pra brincar de casinha. Quando eu queria sair pra brincar na rua com o meu irmão mais velho, eu, minha irmã e minhas primas não podíamos porque meu avô dizia “Menina não brinca na rua, brinca dentro de casa.”

O que passou se foi, mas aquelas ordens e dizeres começaram a construir conceitos dentro da minha cabeça do quão chato ser menina poderia ser. Desde então tudo o que era relacionado com ser feminina me irritava ou às vezes eu até gostava, mas tinha vergonha de passar batom, de pentear o cabelo, de usar vestido e de ser carinhosa. E então, na minha adolescência eu não me encaixava nas doces meninas da minha sala, mas me enturmei muito fácil com as que gostavam de esportes e que falavam de besteira, não da Britney Spears. Mas isso acontecia, exceto pela parte que eu gostava daquilo, mais porque eu não queria mostrar meu lado fraco, meu lado feminino.

Outro dia meu namorado disse que eu bebia igual a um homem e eu me enchi de orgulho, mas por quê? E por que quando ele disse que as mulheres na Polônia misturavam suas bebidas com suco pra tirar o “gosto ruim” e eu achei isso tão estranho? Eu me diferenciei das mulheres. Eu disse a mim mesma “eu sou diferente e me comporto diferente.” Às vezes na minha cabeça eu vejo dois mundos, um com “eles”, que seria a maioria do comportamento masculino e o “elas”, a maioria do comportamento feminino e o outro mundo com o resto dos homens e das mulheres com quem eu me identifico. Por exemplo, homens e mulheres com comportamentos fora do que é o padrão, com uma frase diferente ou um ponto de vista que saiu do (useless word) “normal”.

O problema da maioria das pessoas, não são elas próprias, mas sim a passividade argumentativa e a falta de sede de conhecimento. Sendo assim, elas se tornam ignorantes do que acontece com as pessoas mundo afora, como conceitos que há anos têm feito mal às pessoas, mas que agora são utilizados com outro tipo de abordagem. Como por exemplo, “nossa, você joga como uma mulher.”. Hoje, 2016, depois de ver mulheres arrasando nos jogos olímpicos, sendo bem sucedidas em suas carreiras, ouvindo-as em vídeos na internet falando sobre assuntos conceituais, importantes para qualquer pessoa. Hoje, eu me orgulho de ouvir essa frase. De sentir essa representatividade e eu espero que todos tenham um dia esse tipo de autoanálise para com as caraminholas que passam na nossa cabeça. Centenas de pensamentos inúteis misturados com os úteis que podem fazer você mudar completamente uma visão de mundo. Pois, eu sei sobre o empoderamento feminino, o movimento feminista, mas, ainda assim, eu luto internamente com hábitos de pensamento e comportamento que já estão profundos na minha jovem mente de 21 anos.  

Recentemente eu li o livro Salomé que fala sobre como as mulheres perderem, eu diria, sua posição no mundo. Querendo ser, parafraseando o livro, homens de saia. E então, ao longo da história, as mulheres e o mundo começaram a se afastar da feminilidade. Por que ser sensível se quem chora é fraco? O que vale é o racional, o masculino. O mundo todo saiu perdendo muito nessa dominância de pensamento patriarcal. O livro aborda como essa falta do feminino faz falta inclusive para as próprias mulheres que negam serem o que é por não serem valorizadas por isso. 

Muito está sendo mudado e desconstruído, e para o melhor eu espero que o mundo caminhe. Pois apenas juntos, como iguais as pessoas alcançarão um mundo mais justo e menos desequilibrado.


Vigiai.

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